Classes sociais & estados-de-consciência: “correlações originais”

Da mesma forma como uma fruta ao secar expõe o seu caroço duro, as instituições também perdem a sua essência ou fundamento com o passar do tempo, mostrando apenas as suas formalidades exteriores e perdendo assim a sua legitimidade social.
Soa um pouco difícil ao ser humano moderno imaginar que as classes sociais tenham uma relação de origem com os estados-de-consciência humanos, talvez falar de vocação soe mais fácil, embora não seja algo tão “simples”. A mobilidade social e a evolução cultural teriam mais relação com o assunto.


Uma das longínquas sociedades que levou este tema às suas últimas consequências foi a hindu. Pouca gente sabe que o hoje deturpado sistema-de-castas possui por detrás um método de educação (ashramas) específico e gradual para capacitar as castas (varnas), e que pode ser até permanente para a casta mais elevada. Aquilo que valia realmente ali era a vocação das pessoas, sem acepções de nenhuma espécie.


Tais sociedades originárias visavam um dinamismo social de base não meramente econômica, mas sobretudo cultural. Tanto que os Brahmanes (sacerdotes) encabeçavam o sistema, e pelo que se sabe eles nunca armazenaram maiores riquezas ou mantiveram exércitos.
Sucede porém que esta correlação se inverteu mais tarde ao se determinar as castas pelo nascimento; ainda assim se manteve os ashramas, com certas deformações.

Estas são pois as correlações existentes no varnashramadharma:*

Grau ou condição estágio (ashrama) casta (varna)

1ª iniciação (noviciado) estudante proletariado
2ª iniciação (discipulado) doméstico burguesia
3ª iniciação (iniciado) instrutor aristocracia
4ª iniciação (iluminado) renunciante clero

Assim, estava prescrito de início através de uma educação universal, que todo estudante também trabalharia ou serviria, como é natural pedir desta faixa etária jovem e inexperiente.


Porém, a certa altura o egoísmo e a vaidade, agravados pela questão racial, não permitiu mais que os filhos das castas mais “nobres” se sujeitassem a maiores esforços físicos –que na verdade apenas se tornaram realmente pesados porque nem todos estavam participando disto. Não é preciso insistir muito neste assunto, porque entre nós “modernos” também prevalece este tipo de preconceito contra o trabalho físico e a rígida diferença de classes, acarretando em várias deformações de consciência, onde ao pobre é vetado o conhecimento e ao rico é vetada a humildade –entre outras coisas.


Limitamos acima o nosso exemplo ao sudra (proletário) porque ele é de longe o mais prejudicado. Se tratou de privar esta classe do seu ashram de estudante, estancando assim radicalmente o dinamismo na sociedade hindu. Pois isto é como arrancar uma árvore pelas suas raízes: todo o resto do edifício social fica assim comprometido, e apenas se salva alguma coisa pelas brechas sociais oferecida pelos sistemas clássicos do Oriente. A estratificação social contudo é apenas uma resposta muito “meia-sola“, se a ideia era preservar o sistema.


Situações como estas provocam a revolta do leigo, que facilmente pode querer destruir toda a estrutura social. Contudo, tal como acontece no plano espiritual, a esfera social também é contemplada ciclicamente por reformadores e por restauradores. O próprio Buda fez na sua época um forte trabalho nos dois campos, e como tal não propôs a extinção do sistema de castas mas sim a sua relegitimação (ou refundamentação). A integração e a dinamização ideal deste quadro pode ser representada pela suástica, agilizando a dinâmica dos quatro elementos da Natureza. Outro símbolo do tema é aquele de “recolocar a roda do dharma em movimento”, tarefa dos chakravartins.

Os ashramas ou estágios cuturais: "educação permanente"

Contudo, aqueles que desejam aniquilar profundamente as estruturas sociais, também correm o risco de complicar a evolução da consciência coletiva. A falsa presunção de que todos devem ou podem fazer de tudo mais ou menos ao mesmo tempo, é ridícula e absurda. Quando se tem este tipo de pretensão nada é realizado com profundidade -e não estamos falando exatamente de “especializações”, mas sim de tempo e dedicação para se deter nas coisas, a fim de superar o amadorismo e conquistar o profissionalismo. Nem mesmo bons orientadores se teria de outra forma.


As escolas esotéricas terminam sendo muitas vezes redutos onde a evolução da consciência pode ser praticada através de uma reeducação profunda (donde Jesus pedir para as pessoas “renascer”). Ali nós observamos, através das sucessivas iniciações, a presença destas etapas sociais –comumente minimizadas ou atomizadas, naturalmente, uma vez que objetivos mais avançados se encontram bem definidos. Para que haja esta evolução, é preciso o constante ingresso de novos membros, liberando os mais antigos para novas funções.

Nada disto significa que as estruturas sociais tenham tido uma origem única, muitas vezes as “peças” foram se unindo naturalmente, e em dado momento se resolveu aproveitar estas estruturas para a evolução da consciência através do refinamento das instituições. Por certo tempo este quadro de iniciações coletivas pode ter dado certo, fundamentando as chamadas raças-raízes e configurando as Idades de Ouro e de Prata das sociedades e das civilizações.


* Este quadro pode estar sujeito a certas polêmicas especiais, uma vez que retrata situações ideais e nem sempre reais. A iluminação dos sacerdotes, em especial, somente agora será realmente possível alcançar, até então a humanidade não estava realmente preparada para tal.

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Luís A. W. Salvi é autor polígrafo com cerca de 150 obras, e na última década vem se dedicando especialmente à organização da "Sociologia do Novo Mundo" voltada para a construção sócio-cultural das Américas.
Editorial Agartha: www.agartha.com.br
Contatos: webersalvi@yahoo.com.br 
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Um comentário:

  1. Quanta maturidade em um povo antigo. Os povos dominadores cometem. erros e se impõem modificando os costumes do conquistados. Algumas vezes em muito superiores.

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